sexta-feira, 29 de agosto de 2014

QUE SEJA INFINITO ENQUANTO DURE!

Ah! O Amor tão cantado em verso e prosa. “Que seja infinito enquanto dure” já dizia o poeta. E os relacionamentos? Curtos ou  duradouros? Até que a morte vos separe? Alma gêmea, a outra metade da laranja... Seria mesmo o Amor entre duas pessoas capaz de durar infinitamente?

Em um sábado, durante o chá de fim de tarde, essas perguntas que tantas e tantas vezes permearam minha mente, parece terem encontrado a resposta.

O tio Pedro é um viúvo recente, coisa de seis ou sete meses, não me lembro bem. 

Ele foi uma figura presente na minha infância, um homem muito doce, sorridente, mas,  seus lindos olhos verdes sempre me pareceram esconder uma história misteriosa. E hoje,  ao vê-lo com 80 anos, concluo  que na verdade,  escondem uma tristeza, uma inexplicável saudade.

Estamos conversando sobre relacionamentos, ele me conta que seu casamento fora bem tradicional, tinha durado mais de 40 anos, ele tinha sido feliz com sua esposa, constituído família, teve seu único filho que lhe deu três netos e...                              

 Então,  nesse momento, a campainha toca.  Meu primo se levanta para atender a porta e, de repente, todos na sala se voltam ao ouvir meu tio atônito dizendo:

- Bete?  É você mesma? O quê você está fazendo aqui, mulher?
- Bete? Quem é Bete? Todos nós nos perguntamos.
- É a prima Bete da Bahia, diz meu pai, quase pulando do sofá,  com ar de cumplicidade.           
                             
Rapidamente, meu pai se  aproxima para abraçar a senhora que acabara de entrar na sala com uma pequena valise de viagem nas mãos.

Ela era uma mulher linda, de meia idade, pouco mais de 70 anos, elegante, altiva, com cabelos ondulados esbranquiçados, lindos olhos esverdeados e com aquele sotaque encantador,  de baiana que viveu sua vida toda numa cidade bem próxima de Salvador.


Pois é, a prima Bete assim que soube da viuvez do tio, terminou seu casamento de quase 40 anos, pediu o divórcio e voou para São Paulo. Veio disposta a aceitar o pedido de casamento que ele lhe havia feito há 50 anos.  Desta vez, Bete veio pedir tio Pedro em casamento, veio para ficar com o grande amor de sua vida. 

No mês de setembro, como sonhou a noiva, com a chegada da primavera,  teremos mais um casamento na família:  “ Pedro Alcântara ( 80 anos) e Elisabete Bastos (75 anos) convidam para a cerimônia de  seu enlace matrimonial”.


Na família, todos os solteiros de plantão respiram agora aliviados. É a esperança que se renova.  E que toquem os sinos, que venha o casamento e que o amor seja infinito enquanto dure... 

Autor:  Adenair  Vazz  

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

SATURNO - O PORTAL DA LIBERDADE


A imagem de Saturno não traz muita simpatia perante o senso comum. Em geral, ele provoca arrepios e medo. 


Mas, segundo a psicológa e astróloga Regina Consoline ele pode indicar o caminho para a liberdade.
Na palestra Saturno, o Portal da Liberdade, ela fez o relato de variados aspectos do mito de Saturno em que se inclui a Idade do Ouro. As Saturnálias eram festas para relembrar esse período. 
Segundo ela, "nos esquecemos de que a Idade do Ouro faz parte do mito e portanto também do significado de Saturno astrológico. Essa época benfazeja incluiria importantes efeitos na compreensão astrológica do símbolo saturnino.


Ela explica que esse período significa a expressão da generosidade consigo mesmo e com o outro que conseguimos quando Saturno deixa de ser somente o cobrador. Nesse momento, ele passa a ser, por uma questão de autoconhecimento, o estruturador da personalidade e consequentemente o doador, aquele que dá a liberdade da escolha, curando todas as partes da psique devoradas pelo aspecto cultural ou social".

Por essas informações, podemos entender o nosso Saturno de outra forma, prometendo no mapa astrológico outra gama de significados menos repressores e amedrontadores.
Elas nos fazem refletir de forma diferente a respeito desse importante símbolo astrológico. Talvez com mais responsabilidade e esperança.
A palestra foi realizada no evento da Regulus, escola de astrologia em SP no domingo, dia 17/08.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

O QUE É CASA ASTROLÓGICA

Liz Greene cita uma imagem especialmente bonita para explicar o que é casa astrológica do mapa natal.
A imagem em questão é de outro astrólogo do século I, Marcus Manilius (1). A partir dela, fica simples entender a relação de casa astrológica (que são doze), de seus habitantes (planetas) e do mapa como um todo.

Aí vai a citação de Liz Greeene: "Uma casa é um âmbito neutro da vida que "mobiliamos" de acordo com a natureza de nossa própria essência. Manílio (*) dizia que cada casa do horóscopo é um "templum", e esse termo latino pode nos ajudar a entender o que significam as casas. 

"Templum" quer dizer "templo" que na época de Manílio era um edifício vazio ou um lugar designado como domínio sagrado, carente de todo caráter numinoso (2) enquanto não se colocava nele a estátua do deus para render-lhe culto. Por mediação de cada "templum" da carta natal temos, graças aos planetas ali colocados, a vivência dos deuses ou poderes arquetípicos que são na realidade o desenho inteligente de nossa própria alma."   Liz Greene. Neptuno. Barcelona: Ediciones Urano, 1997. p. 410.

1-Marcus Manilius, astrólogo do séc. I. Obra em cinco volumes: Astronomica, que traz uma visão da astrologia da época.  

2-Numinoso: estado ligado às qualidades da divindade.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

A PRIMEIRA SALA


 Eu já vinha trabalhando há algum tempo como astróloga e atendia as pessoas em minha casa, em seu escritório ou residência. Mas esse arranjo não era ideal, pois havia empregados, filhos, telefonemas a interromper a leitura do mapa. O incômodo acabava sempre acontecendo.  Uma sala adequada se fazia urgente.

E ela veio por indicação de uma amiga. Um psicólogo, amigo seu, tinha períodos livres no seu espaço. Coisas cruzadas, coisas boas. Eu ficaria com as sextas-feiras e as manhãs dos outros dias da semana. A sala era pequena, no piso de cima, ao fundo do corredor comprido.

Tratava-se de um consultório em uma casa grande de dois pisos e uma edícula no fundo do terreno. Lá cabiam uma clínica médica e odontológica, fonoaudiólogas, psicólogas, professora de inglês e esteticista. Cheguei me sentindo, a princípio, estranha num ninho que não era o meu. Fiquei nessa casa, que ganhou significados na minha história profissional, por cerca de quatro anos, que foram importantes por muitos motivos, mas principalmente para o estabelecimento de uma rotina de atendimento.

Cerca de um ano depois de estar nesse espaço cedido parcialmente, tive um momento especial quando surgiu a oportunidade de ter uma sala só minha. Ela era mais ampla e ficava no piso de baixo, ao fundo. Tinha uma janela para um pequeno jardim que era cuidado pelas psicólogas que ocupavam as salas da edícula localizada atrás dele.

Ao longo dos anos eu sabia das folhas verdes de setembro e de outubro e da falta delas no meio do ano.  Às vezes, via o jardineiro mexer na grama, que não crescia e nos pequenos arbustos irregulares que pareciam não vingar. Havia  maria-sem-vergonha, que insistia em brotar mesmo após ser eliminada. Recorrência feliz de vida.

E havia aquela árvore que, embora pequena, era um brinde para meus olhos e cujos galhos, longe de serem frondosos, quase avançavam para dentro da minha janela dando a impressão de serem bem maiores do que eram.

Ela me agradava e passou a me preocupar depois que ouvi do jardineiro encarregado algo que me soou perigo, como se indicasse uma vontade ou intenção de tirá-la de lá. Era opinião de profissional, tá certo. Mas, sua fala dizia: "Muita sombra para as outras flores".  Pensei: “Flores ?! Onde ?” valeria o sacrifício da árvore por causa daquelas espécies tão caseiras e sem gabarito? Não eram tantas, que justificassem o sacrifício da minha árvore. Seria ela arrancada?

Era como se eu tivesse estabelecido um critério de valor para justificar meu medo pela possibilidade de uma decisão que eu não poderia evitar. Afinal a vista do jardim era minha, só isso, mais o galho que sempre estava próximo da minha janela e o soprar dos ventos em suas folhas. Aquele barulho ninguém jamais poderia adivinhar. Como perder isso tudo?   

E havia também o som da igreja do bairro pautando o tempo. Ao final da tarde  um arranjo especial de sinos anunciava as seis badaladas das horas. Alguns clientes, quando voltavam, diziam desses sons que a gravação da fita registrara. Eu me enchia de satisfação por saber que meus clientes iam embora, ouviam as fitas e ainda marcavam esses sons dos sinos.

Outra música surgia, às vezes, quando alguém repetia não muito disciplinadamente sequências de sons num saxofone. Na distância, sopro, metálica saudade e plangência. Quem mais na vizinhança se deixou levar pelo encompridado das notas? Mas esse concerto precário de um jazz sem regularidade não durou muito tempo. 

Esses privilégios acabaram quando tive que desocupar esse espaço que nem parecia estar na Rua Frei Caneca, distante apenas duas quadras da Avenida Paulista. A casa foi vendida e desocupada. Um tempo depois, passando por lá vi tratores enormes aparando o terreno. Uma terra muito vermelha aparecia. Estava embaixo daquela construção velha, que desapareceu. Embaixo da minha árvore.

Foi assim minha primeira sala, com pequenos detalhes que ainda me falam de saudade. Tinha um cheiro de jardim e um som de sinos.  Um ambiente propício para receber os clientes que me visitaram naquela época. Era o início da minha carreira e tudo combinava com os símbolos astrológicos que estavam frescos para mim.

Sobrou o som dos sinos nas fitas gravadas. As notas entristecidas de um saxofone brilhante nos meus ouvidos e os galhos da árvore na janela da minha memória.  Eu nunca fui visitar a igreja de onde provinha aquele som litúrgico interminável. A árvore não saiu de lá, ao menos enquanto eu fui dona daquela janela, que valia pelo galho entrando por ela.  

Ainda hoje ouço as badaladas da igreja marcando as horas e os acordes do músico que tinha minha companhia sem saber. Ainda guardo o horizonte enorme que minha árvore inaugurava todos os dias. 

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

O DOM DA INSPIRAÇÃO

Imagino que deva existir um dom chamado inspiração que, uma vez acionado, nos permite fazer o que quer que nos tenhamos proposto.

Por outro lado, já ouvi muitas vezes que aquilo que imaginamos ter sido criado num minutinho, com a maior facilidade, na realidade é fruto de muita transpiração e só um tiquinho de inspiração.  Não sei.

Só sei que, ficar frente a uma folha em branco, que na realidade não é mais uma folha e sim uma tela em branco, é assustador.   Nesse momento nos damos conta que a nossa mente é um turbilhão de ideias desconectadas umas das outras e que, se não tivermos algum método, nenhuma delas vai pular para o papel.

Ainda outro dia li uma entrevista do Antonio Prata, cronista dos mais renomados, em que ele comenta que, para escrever uma crônica, demora dois dias.  Entre organizar as ideias, ajustar, ajustar, ajustar, e dar o trabalho por concluído.  Dois dias! 

E eu aqui querendo escrever algo interessante, bem feito e divertido em apenas 15 minutos.  Quem eu penso que sou?  Algum gênio da escrita, um psicógrafo ou a reencarnação de algum escritor renomado?  Nada disso, sou apenas um alguém qualquer tentando fazer alguma coisa bacana que não dê muito trabalho.  E, naturalmente, esperando um ótimo resultado.


Esquece, não é mesmo?  O jeito é tratar de arregaçar as mangas e começar a colocar as ideias no papel.  E torcer para que elas se aprumem e formem sentenças, depois parágrafos e, enfim, uma história que não me faça passar vexame.

Autor: Luiza Bueno - Agente de Turismo

Esta crônica foi produzida durante o curso "A Crônica: conhecendo e escrevendo. Cotidiano, experiência e criação" no espaço Gaia Cultural em São Paulo/SP, durante os meses de Maio e Junho de 2014.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

IMPREVISTOS

Como encarar imprevistos quando se é virginiano? Como todo bom virginiano, sou afeito a métodos. As pessoas costumam rotular os virginianos de perfeccionistas.

Entretanto, discordo. No meu caso, sou escravo do método. E como escravo do método, creio, imperativamente, que sempre há o melhor caminho, o melhor processo, a melhor sequência etc.

Eis que, em determinado momento, em determinada situação, para total derrocada de nós, virginianos, surgem os imprevistos. Total sensação de pânico e de angústia, pois imprevistos não fazem parte do vocabulário do virginiano.

No manual que há no cérebro de todo virginiano, não há descrição de como enfrentar imprevistos. Afinal, o que são imprevistos?

Na nossa acepção, são motivos de insônia, são prenúncio de depressão, são perda de produtividade, são síndrome de pânico, são tudo aquilo com o qual não gostaríamos de nos deparar. Mas, dado que ocorrem, mesmo após períodos e períodos de estudo de processos, de caminhos, da ordem natural das coisas, cabe-nos enfrentá-los.


E, com o passar dos anos, mesmo sendo virginianos, desenvolvemos técnicas que nos auxiliam no trato com os imprevistos. E a mais importante delas é o planejamento, é a capacidade que temos, nós, virginianos, de nos antecipar à ocorrência dos fatos. Levantamos hipóteses, traçamos alternativas, admitimos “imprevistos”, enfim, fazemos exercícios e simulamos a ocorrência de diversas situações. Inclusive aquelas com imprevistos. Mas, todavia, se foram previstos já não se pode mais chamá-los de imprevistos. Seria isto mesmo?

Autor: Maurício Avelino Sampaio - consultor financeiro

Esta crônica foi produzida durante o curso "A Crônica: conhecendo e escrevendo. Cotidiano, experiência e criação" no espaço Gaia Cultural em São Paulo/SP, durante os meses de Maio e Junho de 2014.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

A JANELA DO MEU QUARTO PARA O MUNDO

Já se passaram mais de três décadas desde que eu encontrei a astrologia.

Era 1981. O Papa João Paulo II sofria um atentado, Charles e Diana casavam-se como príncipes que verdadeiramente eram, o Brasil entrava lentamente na era dos videocassetes e computadores pessoais.

Observados hoje em dia são fatos longínquos. Depois do Papa João Paulo II, veio o Bento XVI e hoje temos o Francisco. O casal de príncipes se separou. A princesa morreu de acidente de carro. Ele se casou novamente com a amante. E a era do computador se instalou definitivamente de forma insuspeitada. A astrologia também mudou visto ser parte de um caldeirão de cultura e de transformações de toda espécie. 

Naquela época era uma atividade muito mais esquisita do que parece hoje a pessoas ditas sensatas. Estudar esta arte milenar, de mais de 5000 anos, que remonta aos caldeus era uma excentricidade. Era algo do meu temperamento para as pessoas a minha volta. E não adiantava nada o argumento do peso histórico que a caracteriza a meu favor ou a favor dela.

Foi com essa autoridade que ela acabou chegando a mim depois que outro objetivo havia sido concluído: uma tese acadêmica, com defesa, exame de qualificação e muito estresse.

 Depois de cumpridos os passos desse ritual, ganhei liberdade para outras pesquisas e curiosidades, desta vez sem prazos. Era mais uma trilha paralela ao cotidiano. Seria bom se ela pudesse ser relaxante. 

Recebi, então, o convite do vizinho que iria iniciar um grupo de estudos. As aulas ocorreram às quartas-feiras e nelas fui descortinando uma sequencia de símbolos e conceitos abstratos que eram ao mesmo tempo vivos, muito vivos.

Tais símbolos e conceitos astrológicos foram se instalando em meu cotidiano. Alimentavam e faziam a minha delícia e encantamento. Meu interesse era restaurado a cada novo livro. Depois apareceram mais cursos e também uma parafernália tecnológica com computador, vídeo, impressora, disquete e programas, que invadiram e começaram a habitar meu espaço.

Pouco a pouco fui entendendo o desenho do mapa natal, o maior foco de curiosidade. Cada exercício de leitura daqueles sinais era um mundo a ser desbravado, pois havia um centro que pulsava. Falava de experiências e guardava uma pessoa que lá estava escondida. Mas eu podia descobri-la até em seu mais íntimo recanto.

Havia se dado o encontro entre uma linguagem potente de imagens e símbolos e uma vocação até então desconhecida em mim. Ela foi despertando aos poucos, muito devagar. Não poderia ser de outra maneira, pois eram muita emoção e beleza juntas. 

Foi se abrindo uma perspectiva enorme de que somente hoje em dia percebo o significado. Cheguei a este lugar de onde se avista um cenário extraordinário. Daqui, vislumbro a natureza humana que se despeja à minha frente com suas dúvidas e incertezas, repetidos questionamentos contundentes e cruciais de nosso cotidiano, paradoxais e absurdos.

Dessa escancarada humanidade, sempre explodindo e rompendo os limites mais restritivos da lógica, sobra um desejo: de encontrar em meio dela a expressão mais clara e mais limpa da saúde, da cor e da harmonia.

Foi se provando insubstituível a experiência de ver pessoas se alternando perante mim, num desfile multicolorido de vida, com suas buscas, insatisfações e desafios.

Tudo isso por meio de figuras e linhas que constroem desenhos e conversam comigo. Me contam histórias.

E vivencio o momento de poder recolher, a partir do material ali generosamente vertido, uma resposta, uma solução ou uma alternativa que alivie a dor da experiência de viver, que amenize a solidão humana essencial.

Tudo isso ocorreu bem aos poucos, talvez para não me machucar, para não me assombrar. Eu não tinha noção da responsabilidade que estava assumindo perante as pessoas que se voltavam para a astrologia naquele final de século como panaceia para muitos males (ai de mim, astróloga). As respostas nem sempre seriam suficientes em relação ao que as pessoas desejavam.

De forma privada, usufruo desse espaço, que é também garantia de aprendizagem. Esse exercício intenso e contínuo tem me proporcionado uma particular perspectiva da vida. Ela se abre como uma janela de onde tenho uma paisagem cheia de pessoas e de suas experiências. Uma janela do meu quarto que dá para o mundo.
                                 

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

ALMOÇO DE DOMINGO


Na minha crença de criança, todos os domingos seriam como aqueles em que almoçávamos na casa da minha avó materna.  Muita gente reunida, avós, tios e primos, muita conversa e muitas risadas.  E, é lógico, a macarronada com frango que só a avó fazia tão bem.

Mas os melhores domingos, mesmo, já começavam na sexta-feira:  dia de fazer o nhoque.  Primeiro, porque era a única casa que eu conhecia que tinha uma mesa enorme, na copa, que era lavada com água e sabão! Sim, porque depois de toda a trabalheira para fazer a massa do nhoque, enrolar e cortar os pedacinhos, a massa que grudava na mesa tinha que ser raspada com uma faca e a mesa, lavada.  Nessa hora começava o melhor do dia para mim e para os primos que eventualmente estivessem por lá: lavar a mesa e o chão da copa e da cozinha, preparando a casa para o final de semana.

Já viram coisa melhor (para as crianças) ou pior (para os adultos) que crianças, água e sabão, com direito a molhar a roupa?  Só quem viveu sabe como é bom...  E essa “faxina” demorava sempre o dobro do que deveria, com a avó tentando impor uma certa ordem e a tia ralhando com a criançada que exagerava na bagunça.

E quando terminava, nós sempre achávamos que havíamos feito um ótimo trabalho porque, enfim, tudo estava limpo e seco, e então podíamos ir brincar no quintal.  E a avó e a tia exaustas, é claro, por terem feito todo o trabalho e ainda tomado conta da meninada para que ninguém se machucasse.

Mas aí a gente começa a crescer e as coisas vão, pouco a pouco, mudando.  Cada família vai adquirindo novos compromissos, os adolescentes vão formando novos amigos e novas rotinas, os avós vão envelhecendo e perdendo o vigor, e os almoços dominicais vão escasseando.

E aí a gente se dá conta que cresceu, e que não tem volta.  É a faculdade, o primeiro emprego, a ansiedade para entrar na vida adulta, tudo vai nos afastando desses rituais da infância, mesmo porque eles também, praticamente, já não existem mais.  Passamos tantos anos tão ocupados com o nosso próprio crescimento e com os compromissos que temos que cumprir, que demoramos um bom tempo até nos darmos conta da importância que eles tiveram para o nosso crescimento.


Essas reuniões caóticas, com todo mundo falando ao mesmo tempo e rindo por qualquer bobagem, mas recheadas de carinho e amor familiar, nos deram estrutura para dar a devida importância a amizades duradouras e desinteressadas, ao trabalho árduo antes de esperar pela recompensa, ao respeito pelos mais velhos, a amores que somam ao invés de dividir, à ética e à honestidade como parte da personalidade e não como qualidades a serem perseguidas, aos relacionamentos saudáveis, à alegria como parte da vida e ao sonho como mola propulsora para nos levar à frente.


E assim o tempo vai passando e a nós cabe a responsabilidade de proporcionar  novos almoços de domingo.  Para o núcleo familiar que ainda temos, para os novos membros que chegaram e para os que ainda vão chegar e, assim, ir passando essa chama para as próximas gerações, para que esse sentimento de pertencer a alguma coisa e a algum lugar não se perca no materialismo que tenta dominar as nossas vidas. 

Autor: Luiza Bueno - Agente de Turismo

Esta crônica foi produzida durante o curso "A Crônica: conhecendo e escrevendo. Cotidiano, experiência e criação" no espaço Gaia Cultural em São Paulo/SP, durante os meses de Maio e Junho de 2014.