quinta-feira, 19 de maio de 2016

ISSO VAI PASSAR, LAURA

Ela tem vinte e cinco anos. Clara e cabelos escuros na altura do pescoço. Maquiada, unhas bem tratadas e com esmalte escuro, brincos e uma roupa alinhada. Era um almoço de aniversário, um churrasco no alto do prédio, com visão ampla do bairro e da cidade. O Museu do Ipiranga ao longe, farta vegetação à  volta, um céu azul e calor convidativo à cerveja e ao encontro de amigos.
Mas, ela era só tristeza. Dos lábios vermelhos de batom, saíram palavras de mágoa. O namoro tinha acabado havia quinze dias. E o que doía mesmo era a maneira como ele terminara o relacionamento. Foi se afastando, devagarzinho e depois, pelo telefone, rápido e sem muito tempo para conversa. Na verdade, isso era o grande desconsolo. Frustrante. Como? Sem explicação?
Durara por longos cinco anos e meio. Onde empacotar e guardar tanta memória? Em que desvão da vida enterrar um amor desastrado?  Chegara a hora de uma revisão. Quando ela se distraiu? Que comportamentos ela não percebera? Sim, lembrava-se de um dia. Em outra situação, uma conversa, palavras desconexas. E um ou outro telefonema prometido e que não se realizou. Agora talvez tudo fizesse mais sentido. Triste caleidoscópio de lembranças.
Infelizmente, uma história pouco original. E a reação de Laura possivelmente também repetirá o lugar comum.  Ela vai chorar, sofrer, conversar tempos longos com amigas, ao vivo e por telefone, skype e msn, whatsApp, amadurecendo e encorpando as mágoas, ouvindo as opiniões variadas, medindo e comparando as sugestões.
Entretanto, nada aliviará as sensações de altos e baixos, de humores e emoções voláteis, imagens a lhe visitar os olhos vidrados, a atenção distraída. Quem solucionará o problema? Quem lhe falará a palavra mágica que a libere da dor de amor?
Ninguém, Laura. Essa demanda será tempo perdido. As soluções são, em geral, paliativas e não vão à raiz da dor.
Sei que será muito difícil você me ouvir, pois todo o contexto social lhe conta uma história diferente, que pesa em seu comportamento de forma muito sutil. Ouvi escapar de sua boca a reclamação com tom fatal: “Já tenho vinte e cinco anos.”  Você talvez acredite mesmo que sua vida só será completa quando se casar. Talvez se sinta sem opções e – pior- velha. Será? Sim, mudar essas ideias, pedras fundadoras de uma cultura,  é muito difícil.
Você conseguirá permissão para outras alternativas? A sugestão para abrir espaço entre sua dor e a realidade talvez não faça sentido. Se eu lhe pedir que coloque em outra perspectiva o sofrimento, no canto que lhe cabe, fará menos sentido ainda. Como observar de forma mais distante se dói tanto? É difícil relativizar o sofrimento neste momento de falta em que escorregamos para um buraco que se abre.
Em vão tento um diálogo mudo. Então, me faço cúmplice silenciosa dessa mulher a partir do feminino que nos une. Lembro neste instante de todas as mulheres que já se sentiram assim tão sem esperança em momento de plena juventude. Tão aberta à parceria e a uma vida a dois. O peso que sobrou para você, muitas mulheres já levaram e continuam levando nos ombros. Uma espécie de luto pela perda de um sonho, sem contar o abandono da própria identidade em relação a um conceito social cobrador e até repressor.   
Laura, esse tipo de homem não dá. Você apostou muitas fichas nesse jogo. Foi fiel por cinco anos. Hoje, você pede revanche à vida: “Ele ainda vai se lembrar de mim.”. Não vai, Laura.  Ele vai tentar esquecer tudo e vai fazer novos relacionamentos, criar novas situações. Para se lembrar, teria que ser outra pessoa.   
Seja você outra pessoa. Seja a mulher linda que você é. Lembre-se agora das mulheres de Atenas, das árabes e africanas de hoje, das mulheres de todos os tempos e de todos os lugares. Ponha-se ao largo dessa tormenta. Nem é necessário queimar sutiã ou dizer palavras de ordem. Faça uma revolução interna. Que seja breve este momento triste. Depois dele, faça a sua hora de preparo para o momento seguinte, para o encontro com o masculino, em outra esfera de grandeza. Haverá outro homem à sua espera.
Mude a cor do batom e refaça a maquiagem. Isso, com certeza, vai passar. 

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