quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

SOBRE PÉS, JOANETES E MÉDICOS ORTOPEDISTAS



Os pés podem (ou não) ser referência de beleza em nosso corpo. Eles nos conduzem pela vida e, além dessa função mais do que nobre, por serem estratégicos são protagonistas de histórias particulares. Em especial, pés bonitos sempre foram motivo de atenção por parte de homens e de mulheres, embora por motivos diferentes.

Os meus desde que começaram a apresentar joanetes e calos me exigiram atenção inesperada e especial. E esta história começa muito cedo em minha vida, quando na adolescência vi um osso lateral começar a crescer no meu pé direito, algo que meu pai tinha. Simples joanete, nada grave, mas a partir daí  tive que escolher melhor os sapatos. Lá estava a paternidade marcada a olho nu, muito além dos cromossomos e DNA.

Fui assim andando com o pé direito cada vez mais torto, até que o esquerdo também desenvolveu a anomalia. Não que isso me tirasse do sério. Não! Eu procurava levar a questão naturalmente, apesar de me sentir cada vez mais longe daquele sapato especial de bico finíssimo ou daquela sandália cheia de tirinhas brilhantes que só marcavam mais a elegância dos pés. Não, eu procurava me distrair desses objetos de puro luxo.

A verdade é que não havia a menor graça nos meus pés. Nada daqueles pés lindos e delicados que apareciam em propagandas, nas praias com os dedos pintados de muitas cores, todas lindas. Nada de uma presença para ser acariciada por namorado, em cenas íntimas e românticas.

Por sua vez, os ortopedistas sempre me olhavam com interesse, indicando cirurgia. Entretanto, nada me fazia sentir a necessidade de operar o desconsolo ósseo. Nem a vaidade, nem a hipótese de um namorado tarado por pés.

Eu fugiria sempre do bisturi, como o diabo da cruz. Essa era a minha história. Como advogar pés tão feios contra a possibilidade de uma cirurgia? Arrumava muitos argumentos e o principal deles era a ausência de dor.   

Mas, aconteceu que o pé esquerdo, o outro, começou a doer de forma estranha. Numa viagem, em meio a largas caminhadas, percebi que não podia apoiar o pé. Sentia muita dor e incômodo. Comecei a mancar. Um verdadeiro desastre ortopédico estava acontecendo. Era a primeira vez que eu me sentia tão reprimida nos movimentos por causa dos pés. Rapidamente, comecei a rever meus critérios sobre cirurgia. Se fosse necessária – ai – que fosse logo.

Ao voltar para casa, tinha que resolver a questão do médico. Olhei o caderninho do convênio. Marquei logo três consultas.

Na primeira, o médico nem examinou os pés. Mandou que eu tirasse chapas e depois, me mostrando o óbvio, disse que eu deveria fazer a cirurgia. E, que fosse logo nos dois pés de uma só vez.  Claro que ele nem me ouviu em relação ao tipo de dor ou onde doía. Agradeci e fui ao segundo, dias depois.

Este me ouviu, fotografou o pé, viu as chapas, me pediu para ver a sola do meu pé e aí descobriu algo que eu não tinha visto. Ele perguntou se era ali que doía. Confirmei. Olhei e fiquei surpresa em perceber que não tinha visto aquilo. Era um pequeno buraco ou uma formação meio dura na pele grossa da sola do pé.

Ele então falou claro, diagnosticando: olho de peixe. Quer dizer, então, que a dor provinha daquilo?, perguntei. Sim, disse ele.

Não pude evitar o riso. Alívio e descompressão. Saí dali muito feliz. Como não se sentir assim quando o mundo se abre novamente à nossa frente?

Bem, o pé continua o mesmo, o olho de peixe (ui) deu um trabalhão. E minha esperança de não passar pelo bisturi se manteve. Naquela época, foi o bastante. Mas a história continuou em outros capítulos.

Sim, acabei fazendo a cirurgia um tempo depois por causa do joanete no pé esquerdo. Com um médico que pegou no meu pé e o olhou com um carinho que somente um médico muito bom ortopedista (e especialista em pés) poderia fazer. 

Cheguei ao consultório com a mesma desconfiança de médicos ortopedistas. Porém,  decidi sem medo depois de ver meu pé no seu colo, sendo observado com olhos doces enquanto suas mãos faziam quase uma massagem nele. Incrível. Como não confiar? 


Uma versão um pouco diferente desta crônica foi publicada pela primeira vez no site Crônica do Dia, no mês de Dezembro de 2010, com o nome Sobre pés bonitos e joanetes. Você gosta de ler? Não perca o site Crônica do Dia: www.cronicadodia.com.br/2010/12/sobre-pes-bonitos-e-joanetes-ana.html 

2 comentários:

  1. Eu também tenho uma história sobre os meus pés. Ao contrário dá sua experiência, ninguém na minha família apresentou problemas desconsertantes com os pés.
    Tenho uma artrose abaixo dos dedões em ambos os pés e outras coisitas que fazem que eu tenha uma espécie de dormência com certa frequência.
    Não consigo andar com sapatos com salto alto e descobri isso em um casamento quando de repente me vi forçada a andar descalça... Simplesmente paralisia sentindo muita dor..
    A sorte foi ter achado um médico ortopedista que a exemplo do seu, pegou nos meus pés avaliando-os com uma especial atenção. Em seguida, desenhou uma palmilha adequada para mim. Foi o céu na terra.
    Preciso trocar sempre de sapatos.. cada dia um e se for caminhar, sempre de tênis com a minha palmilha.
    Saltos altos, nunca mais.
    Foi assim..

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  2. Analuribeiro43, então você sabe realmente o que significa uma história de pés e a descoberta de um médico ortopedista especial!Até pensei que seria o mesmo... rsrs... exagero meu, claro! obrigada por partilhar a sua narrativa!

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