quinta-feira, 8 de setembro de 2016

OS RIOS DA MINHA VIAGEM

Tejo
Cada viagem tem um jeito, uma marca. Os rios deram o tom desta viagem. Foi sem planejamento e me vi diante de vários deles, andando por suas margens.

Percorri as margens do Douro no Porto, o Tâmisa em Londres e o Tejo em Lisboa.

O pequeno rio em Oxford? Era o Tâmisa antes de ser grande. Desci as ruas desde o centro histórico na direção do vale onde ele passa. Não muito longe, cheguei à ponte. Não quis atravessar e, então, procurei pelas margens. Encontrei um caminho chegado às casas que margeiam o rio e que por isso têm uma visão privilegiada dele. Passagens apertadas que funcionam para dar acesso à vizinhança que mora por lá. Casas grandes, antigas, que margeiam as águas de um rio apertado entre o casario da parte mais nova da cidade. Não devem ser bem aceitas pessoas estranhas à intimidade daqueles arbustos. Minha curiosidade era um abuso. Barcos pequenos passavam em suas águas, pouco largas. Ele iria crescer muito ao longo de seu caminho. 

Tâmisa
Em Londres, ele é imenso, caudaloso. É  maior de idade. Andar pelas margens do Tâmisa no verão é uma festa. Barcos passeiam viajantes que, como eu, olham a cidade. E ouvem (ou não) as explicações dos guias cheias de piadas britânicas. Talvez seja difícil para o estrangeiro entender as nuances irônicas desse humor, mas quem se importa? O rio Tâmisa fala a linguagem de Londres e nós a entendemos. 

Enquanto meus olhos acompanham as pontes, as edificações potentes das pedras e arquitetura londrinas, minha imaginação anda pelas histórias de reis e rainhas que duram muito tempo, em um império que, dizem, foi cruel como muitos outros. Shakespeare às margens dele, pensa seus personagens e cria ficções humanas que durariam muitos séculos.

O Tejo em Lisboa mais parece mar. Mas quando nasce na Espanha leva o nome Tajo. Quando chegamos a sua borda logo da enorme praça do Comércio podemos jurar que é o mar.  Dizem que a estátua de d. José I foi planejada depois da destruição do grande sismo de 1755. A cidade destruída passou por reconstrução e o Tejo acompanhou tudo como testemunha.  Talvez dele venha a coragem de reconstrução de sua cidade e dele também tenha vindo a  inspiração para aos viajantes que desde cedo foram aos mares para descobrir mundos. 

Na época dos descobrimentos, Portugal era uma espécie de cabeça da Europa  voltada para o mar. Era ali que os desejos dos portugueses se voltavam para os espaços abertos na busca de destinos desconhecidos.

Douro
Por sua vez, o rio Douro, no Porto, é abraçado pelo Cais da Ribeira. Por montes e montanhas, ele vem de terras espanholas e construiu um microclima especial para os azeites e vinhos de seu lugar de origem, até os entrepostos de distribuição. Os tonéis são carregados por barcos de desenho elegante. Antigo e delicado. Por caminhos estreitados pela geografia. É um rio que teve que lutar para seguir forte. Parece que não houve mudança nesse transporte ao longo do tempo. Talvez também não tenha mudado o gosto de seus produtos. Deve ser por essa riqueza que a cidade apresenta hoje muitas obras de restauro em suas edificações. Resgate de uma história, guardadora de  memória e cultura.

Todo rio é inspiração para uma cidade. Os homens os escolhem porque precisam dele. E ele generosamente se oferece para ser caminho e vida.

Foi a viagem das bordas dos rios. 

Eles têm um começo, um meio e um fim. Suas águas engrossam desde a nascente e tomam da terra mais e mais. Até que suas margens se alargam. Guimarães Rosa diz que há uma terceira margem, complexidade e mistério. Desconfio que sim. Quem sabe há até mais margens do que essas três?

Na verdade, viajar não é somente explorar cidades, parques, estradas e montanhas. Explorar geograficamente os espaços é apenas parte de uma experiência maior.

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