segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

DE SORRISOS E LUZES DE NATAL

Eu estava sentada esperando a vez para ser atendida numa loja dos correios. Antes de sentar, olhei à volta e cumprimentei as pessoas com quem pude trocar olhar.

Não percebi quando uma senhora se sentou ao meu lado e se dirigiu a mim.“Será que eu poderia ser sua amiga?”; o inesperado da situação me surpreendeu. Pensei: “Como? é isso mesmo o que eu ouvi? Um pedido para ser minha amiga? ” Essas e outras mil perguntas aconteceram nesse momento dentro de mim. O que dizer? O que fazer? 

Era uma figura discreta em meio a um grupo ansioso e também discreto. Blusa e calça comprida pretas. O rosto limpo de pele tratada, o cabelo escuro puxado atrás da nuca. Na faixa dos cinquenta - talvez sessenta? - Tinha a expressão do rosto calma. A voz era clara.

Em seguida, ela continuou a conversa, tirando-me do primeiro susto. O objetivo foi diretamente colocado, explicando-me tranquilamente o motivo da abordagem. “Você me sorriu e eu estou muito só”, disse-me. Daí então falou mais. Mudança de cidade, de bairro, situações que todos temos na vida. 

Mas e a coragem para ir a alguém desconhecido e fazer o pedido, de onde veio? Será assim grande o tamanho da solidão que justificasse esse movimento? Sim, porque ela pode ser de vários tamanhos e tipos. Quantas histórias de solidão conhecemos? Pessoas que a vida abandonou e que não têm onde se apoiar? Estar só como num balão ao léu ou num barco à deriva. Em um deserto sem fim. Mas, há também a solidão que, em vez de doer, nos oferece a alma. Aquela que é amiga. Na verdade, há muitos tipos de solidão.

Talvez a solidão não tenha sido o motivo desse gesto. Ela mesma me disse a razão. Era o sorriso que naquele dia estava disponível para o exterior de mim. O poder de um sorriso, só isso. Nem parece tanto. Mas foi ele que de dentro de minha própria solidão clareou de algum modo os desvãos de uma pessoa que se sentia só. Eu estava aberta ao mundo com ele na face e um contato se fez. 

Este acontecimento fortuito me mostrou como se resolve uma carência que, às vezes, parece até um abismo.

No entanto, eu posso enumerar coisas – pequenas - que me fazem bem nos momentos de solidão. São detalhes que me fazem sentir acompanhada em um contentamento justo. São simples e acordam minha alma. Às vezes, são palavras em uma mensagem ou um telefonema, um recado deixado na secretária. Até as luzes de Natal podem ter essa função e me colocam um sorriso no rosto.

Embora haja quem as tome por artimanha do comércio, esqueço essa possibilidade. Procuro na memória as luzes no elegante perfil das árvores à volta do lago do Parque Ibirapuera. A simples memória delas, me tira da distração do cotidiano e faz meu corpo vivo. Simplesmente eu, acompanhada de mim mesma, com um sorriso, em uma solidão feliz. 

E, de repente um deles, um sorriso distraído, teve essa função de trazer alguém para um contato. Ele acordou uma pessoa, promessa de amizade. Naquele dia, lhe disse: "Sim, obrigada pelo convite. Eu gostaria muito de ser sua amiga."

Será bom se isso puder ser verdade. E agora mesmo, outro sorriso brota em minha face que de tão grande valeria até uma risada por imaginar que faço um contato com você, que me lê e que, com sorte, também tem um sorriso nos lábios e até desenha em sua memória imagens de outras luzes de Natal.
 
PS: O link a seguir é do site Crônica do Dia, em que o texto foi pela primeira vez publicado:http://www.cronicadodia.com.br/2012/12/de-sorrisos-e-luzes-de-natal-ana.html

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